sábado, 3 de maio de 2014

Caminho de terra e mar



Caminho de terra e mar, suspenso sob um céu azul intenso, ar pleno e táctil, quente do sol e salgado do mar. Caminho sem me sentir, os pés não tocam no chão. Estico-me para sentir a maciez da terra, evitando as rochas e os arbustos que teimam em crescer e roubar espaço às rochas, impávidas e seguras do tempo que as faz eternas.
Zumbidos ecoam ao longe, exércitos pacíficos de gaivotas vão e vêm à minha frente e quase consigo tocá-las na ilusão de com elas sobrevoar o mar e poder abandonar-me ao seu destino.
Gaivotas sábias que amam o mar e o mar lhes chega para serem felizes. Que imensidão azul se estende lá em baixo, tão grande que assusta e conforta, porque tanta beleza só pode ser magia ou ilusão, não fosse o cheiro a sal e a maresia que nos invade, nos sufoca e nos faz sentir a vida.
As pedras estão mornas, cheias do pôr-do-sol, consigo sentar-me e fico parada até me doerem os ossos, os músculos e cada célula do meu corpo. Mas não me mexo, não consigo, estou imóvel, presa por mim, condenada a tanta beleza.
Adormeço. E o mar foge. Desaparece. Está perto mas não o vejo. Quero chegar à praia, mas vejo-me criança, deitada numa rede sob os pinheiros. A minha mãe faz crochet ali perto, o meu pai joga às cartas com os amigos. E eu só quero crescer, ter uma vida de adulta, poder decidir quando vou ver o mar, sem esperar por ninguém. E o tempo demora, cruel.
Agora aprendi que o tempo atraiçoa. O mar parece igual, mas o tempo corre, deixa-nos para trás. Ilude-nos. Contudo no caminho de terra e mar, entre a terra e o mar, sou eu quem decide.
E escolho o mar.

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