segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Mil cores

Queria poder pintar o teu cinzento com as mil cores que invento nos meus dias. À força de insistir nos tons alegres, os olhos habituam-se à luz e fogem do escuro em busca da alegria. Queria tanto ensinar-te a ser feliz. Ternura que surpreende num olhar que fica. Tempo passado, perdido à luz da razão, cinzenta e triste. E sempre esta ternura que não parte mesmo assim, sem saber, presa e perdida no rasto da esperança que se foi. Criança que se aninha junto à mãe e fecha os olhos, sem pressa de crescer. Luz que chega e mostra mil cores de um só dia apenas num instante. Fogo de artifício que se solta em cor dentro de mim, transborda dos meus olhos até tocar os teus. No instante em que te vejo. Para te ensinar a ser feliz. Para sempre. Perto de ti.

sábado, 19 de dezembro de 2009

Será?

Por vezes penso, mas não te digo… o que sentirás quando eu me for? Quando não te encontrares mais no que eu escrevo e sentires que o teu lugar em mim se foi?
O que farás então? Será que me verás na face de outra mulher e pensarás mil vezes em sobressalto que me encontras entre a multidão? Será que gritarás o meu nome por engano sem saberes? Será?
Ou será que deixarás de me lembrar muito antes de me esqueceres, apagando cada momento nosso um a um, para negares que me tiveste e que, sem querer, me deixaste partir, sem sequer saberes porquê… e depois, nesse dia, farás o quê?

domingo, 6 de dezembro de 2009

Gaivota ao pôr-do-sol


Fico por vezes suspensa… entre o ser e o estar, entre o sentir e o esquecer, entre o sonho e o desencanto, algures num espaço infinito, onde apenas consigo pairar, esboçar gestos, aflorar sensações, respirar apenas, esquecer ambições, como as gaivotas abrir as minhas asas e encher os meus olhos de mar e colorir o meu mundo com as cores de um pôr-do-sol de despedida.
Entre os meus voos de mar vejo em sonhos a onda maior que teima em passar e varrer o meu mundo. Lembro-me de pensar que é altura de existir apenas, sem lutar, respirar baixinho, vendo os dias passar apenas, suspensa, talvez iluda a tristeza que só nos chega quando perdemos a capacidade de sonhar e de esperar por nós.
E assim entre o ser e o não ser, entre o sentir e o esquecer, um carinho teu é o que me faz regressar à vida, pousar os pés de novo na areia, enfrentar a onda maior e salvar o meu mundo.
E estejas perto ou longe de mim, ambos sabemos bem, que isto de ser ou de haver alguém que nos faz seus, não é decisão que nos caiba a nós tomar. É tão só apenas o que nos faz regressar e acreditar que por maior que o voo seja, haverá sempre alguém com um carinho à nossa espera.

sábado, 21 de novembro de 2009

Onde?

Onde se escondem os amores que não se vivem? Em que parte do coração ficam guardados, fechados, sem correr o risco de se transformarem em mágoa, tristeza e dor?
Aqueles que desperdiçámos porque não soubemos retribuir, aqueles que quisemos mas nos foram negados, todos os amores do mundo, que bom seria poder guardá-los sem os matar nem deixar apodrecer sob a capa doutros sentimentos menores, negativos ou mesmo destrutivos para quem os não pode viver.
Melhor seria poder lançá-los no universo, deixá-los percorrer a Via Láctea, pura energia transformada em cauda de cometa esplendorosa que todos vissem e a todos maravilhasse. Num universo em expansão quantos amores não caberiam? E assim todos os suspiros, sonhos ou devaneios permaneceriam para sempre, intocáveis, puros, guardados para quem os não pode viver e nem uma gota de felicidade se perderia nas marés-vivas da vida.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Tudo

Gostava de me contentar com menos
De não exigir tanto onde existe naturalmente tão pouco
De não ter de sentir que dou tudo para me sentir completa
De não ter de sentir que recebo tudo para achar que vale a pena
Gostava que apenas metade de tudo já chegasse para me fazer feliz
De aceitar os dias como eles são
Não mais que tempo, não mais que espaço a preencher com vida
E de tudo que me cerca ter coragem para fazer um novo dia!

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Poderia dizer-te

Poderia dizer-te que te amo…
Como se numa palavra só coubesse tudo aquilo que por ti sinto
Como se o mar fosse apenas a onda que nos chega até à praia
Ou um relâmpago nos trouxesse a eternidade
Como se uma vida inteira chegasse para ser tua
Ou um carinho perdurasse para sempre
Como se o hoje fosse para sempre o passado e o futuro num momento
Ou o esquecimento a lembrança de outra vida
Poderia dizer-te que te amo se amar-te fosse viver-te nos meus sonhos
E se a palavra saudade chegasse para dizer toda a falta que me fazes
Quando acordo sem ti todos os dias

sábado, 31 de outubro de 2009

Momento

Chego primeiro, hesito na escolha do lugar, decido esperar. Olho em volta, ouço o meu respirar, sinto cada poro que se abre para te receber, cada músculo suavemente contraído, como se cada pedaço de mim se quisesse mostrar e fazer presente neste momento. Como num exercício físico, cada ínfima parte do meu corpo é chamada à vida, trespassada pelo sangue e pela espera. Penso, “não devia ter vindo”, sabendo que nunca poderia ter deixado de o fazer. Sabendo que estou ali por ti e por mim, mas não por nós. Ainda assim, estou ali e espero por ti.
Eis que te sinto chegar antes de ter ver. E vejo-te então por entre a multidão, adivinho os teus passos, sinto-me invadida pelo teu sentir no momento exacto em que aprisiono o teu olhar, naquele segundo em que em simultâneo respiramos fundo sem conseguir libertar o ar dentro de nós, para assim alargar espaço e dar lugar ao coração que, de repente, nos sobra no peito.
E ficas preso a mim, ligado por um fio invisível, mas tão palpável, que quase chega a incomodar quem, apressado, passa entre nós. É este o momento mágico que dura um segundo mas vale por uma vida. O momento em que eu não sou ainda eu, nem tu és tu e em que tudo é ainda possível de acontecer e de vir a existir para sempre entre nós, o instante exacto em que sonho e realidade se cruzam, em que bastaria uma palavra mágica para todo o mundo ser nosso.
Mas eu sei quão breve é esse momento. Olhos que se perdem, mãos que não se dão, ar que por fim abandona o meu peito, coração que aceita sem sossegar, com revolta se cala e aprende contigo a fazer de conta que foi engano, que o amor afinal não mora ali.
E eu penso então que aquele momento talvez pudesse ser tudo, mas afinal não foi nada. E que o amor não existe no meu peito para ser negado, mas sim acarinhado. Realizo que não devia ter vindo e quando me alcanças, te inclinas para mim e me cumprimentas, tu não o sabes, mas eu já fui embora.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Obrigada, Amigo!

Morrer é partir e deixar memórias órfãs por não poderem mais ser partilhadas com quem as criou e as ofereceu aos que ficam sozinhos para as recordar.
Guardo comigo a aprendizagem, a gratidão e o carinho para continuar a descoberta da vida em novas partilhas e em memórias que assim se perpetuam, pois ninguém morre verdadeiramente enquanto houver alguém para o recordar…

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Ânsia

Ânsia de viver o que sinto, exactamente do modo como sinto, sem tirar nem pôr. Ânsia de dizer o que penso mas guardar a última frase para mim, traquina, deixando ao sabor de quem me ouve a procura do ponto final para o que digo. Ânsia de fugir de quem me fala para procurar as respostas que não tenho, nem quero dar a ninguém, porque não são precisas. Ânsia de encontrar o que não procuro para assim ser surpreendida. Ânsia de correr mundo para voltar ao meu ponto de partida e nele descobrir afinal o tesouro imaginário do meu impossível feito realidade. Ânsia de perfurar as profundezas, mergulhar no mar, explodir o ar, vencer a velocidade e parar o devagar. Ânsia de saber, conhecer e ensinar o que ainda está por descobrir. Ânsia de me esconder, de desaparecer para poder regressar e ser eu a escolher o meu lugar. Ânsia de aprisionar para ter e dar o prazer de libertar. Ânsia do vazio para que o todo seja meu. Ânsia de viver, de amar sem dor nem esperar. Afinal, apenas ânsia de ser eu.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O tal "talento" muito pequenino e muito escondido!












A pedido da S* (e vejam isto como um acto de coragem, por favor!) mostro dois quadros pintados por mim em acrílico numa altura em que me apetecia pintar flores

domingo, 11 de outubro de 2009

Um selinho lindo!

E eis que recebi um selo liiiindo do nosso amigo Swadharma, OBRIGADA! do blog
http://a-place-like-home.blogspot.com/
e as regras para merecer este selo são as seguintes:
1. Postar o link de quem indicou
2. Postar o selo
3. Passar o selo a 5 blogs perfeitinhos, e que são:
http://zoologico.blogspot.com/
http://chuvadelivros.blogspot.com/
http://florestadasleituras.blogspot.com/
http://lenfanterriblelx.blogspot.com/
http://asminhaspequenascoisas.blogspot.com/
4. Responder às seguintes perguntas (eu vou responder, mas como não gosto muito de impor regras, os 5 blogs por mim escolhidos são livres de fazerem o oue bem entenderem)
* Mania: Mexer no cabelo
* Pecado capital: Arranjar sempre maneira de "levar a minha" avante
* Melhor cheiro do mundo: O mar
* Se o dinheiro não fosse problema: Vivia feliz numa cabana à beira-mar
* História de infância: As refeições eram um martírio, detestava comer, em compensação agora adoro e como muito e tudo o que me apetece, sem nunca passar dos meus 50 Kgs
* Habilidade como dona de casa: Cozinhar (claro!) e improvisar na cozinha
* O que não gosto de fazer em casa: Passar a ferro (brrrr!)
* Frase preferida: Muitas, mas a minha preferida no momento é: "A vida é demasiado preciosa para ser vivida num mundo desencantado", Mia Couto
* Passeio para o corpo: Uma praia em Bali
* Passeio para a alma: Oriente (Índia, Malásia, Vietnam, Bangladesh,por aí...)
* O que me irrita: A preguiça e a acomodação das pessoas que atribuem tudo negativo ao "azar"
* Frases ou palavras que uso muito: Obrigada, troll, caramba
* Palavrão mais usado: Se calhar sou "snob" mas não uso, odeio palavrões
* Vou aos arames quando: Não acreditam em mim
* Talento oculto: Desenhar, pintar
* Não importa que seja moda, eu não usaria nunca: Piercings (brrr!)
* Queria ter nascido a saber: Medicina


sábado, 10 de outubro de 2009

Amar-te é...

Amar-te é ter-te em mim
É sentir-te sem te ter
É ter-te sem te tocar
Adivinhar-te sem te ver
É esquecer o passado
Ignorar o futuro
E viver o presente intensamente
Deixar fluir, respirar, viver, sonhar
Mergulhar no teu azul
Perder-me sem regresso
Nem vontade de voltar
Seguir sempre em frente alegremente
Como se de mim apenas dependesse o amanhã
E tudo ficasse suspenso em teu redor
Amar-te é viver apenas
É ser tu sem deixar de ser eu
Sem saber qual dos dois eu sou afinal

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Agora

Agora que o silêncio das palavras acabadas tem a vastidão do mar em calmaria
Agora que as ondas se perdem em areais vastos e macios
Esquecidas das rochas duras que antes as desfaziam
Agora que, às escondidas da lua, as estrelas trocam brilhos
E que o azul e a luz se completam em harmonia
Poderei por fim partir de ti em paz
Sabendo que o mar apagará todos os meus traços
E que de mim não ficará em ti qualquer sinal

Fui brisa que te abraçou sem tu sentires
Fui farol, âncora, chão e mar sem que me visses
Criança, colo, ternura e amor
Fui tudo e em tudo fui tão pouco
Que te perdeste e te encontraste em mim sem o saberes

Mas agora tomo para mim o que me resta e parto de repente, sem aviso
Em busca de um novo mar que, sem medo, me acolha e me deixe apenas ser feliz

sábado, 26 de setembro de 2009

Fecho os olhos

És luz involuntária e absoluta que me invade e perfura cada poro até iluminar e desvendar todos os meus becos esconsos, escuros e escondidos em mim.
Fecho todas as portas, as janelas, corro os cortinados mais pesados, tapo cada ranhura, numa tentativa vã de não te deixar entrar. Quero preservar o meu lado escuro onde me posso fechar incólume e cultivar a indiferença de que preciso para sobreviver sem dor.
Mas mesmo sem quereres, tu alcanças-me e preenches todos os meus espaços, escancaras as minhas verdades em troca do teu imenso vazio, num jogo sem lei onde eu sei, sou sempre perdedora.
E é tal a tua luz que me faz transparente, trespassada por mil sóis que me cegam apesar de tão distantes. Mas eu sei que a tua luz ilumina mas não aquece. Tem brilho, mas não resplandece, fere, dói e faz chorar.
E eu fecho os olhos com força, não sei se para te impedir de me chegares, se para não te perder, impedindo-te de sair de vez de dentro de mim.

sábado, 19 de setembro de 2009

Estátua de sal

Estátua de sal
Resto de mar, azul e espuma
Perdida e esquecida na areia
Numa praia qualquer
Longe, ténue, hirta e fria
Gaivotas que voam
Tempo sem fim
Contam-se os dias
Cegos do sol
Surdos do vento
Sonhos apenas
Onda que a desfaz sem medo
De volta ao mar
De volta à vida

sábado, 12 de setembro de 2009

Chegaram as chuvas

Chegaram as chuvas. Fecha-se o tempo sobre o verão e sobre uma infância longínqua, algures perdida no tempo passado, planos feitos, alguns vividos outros sonhados, ainda esperados. Altura de nostalgia do que foi e podia ter sido, do verão e das despedidas, primeiro do mar rumo ao Douro e depois do Douro de volta a Lisboa, para um reencontro ou um recomeço da vida, na escola, com os amigos de sempre, mas ainda assim com a nostalgia da separação de algo amado, mesmo que para o reencontro ou a descoberta de um outro amor.
Passaram-se os anos sobre essa infância, ficaram as lembranças das imagens, da nostalgia dos sentimentos vividos, do cheiro das primeiras chuvas sobre a terra molhada que sempre me levam de volta a esse sentir.
Na vida como no verão, o fim trás nostalgia mas também esperança de recomeço, balanços feitos e planos que se constroem, sentimentos que se rompem ou se descobrem. Longe ou perto, passado ou futuro, mas nunca esquecendo que a vida é aqui e agora.

sábado, 5 de setembro de 2009

Por amor


Apenas por amor
Iluminei o sol, acendi estrelas e pintei o luar
Fiz nascer rios, conquistei montanhas e percorri florestas
Fiz da estrada um rumo, do vento uma rota e do mar um lar
Espelho de mim, de cada alegria ou de cada dor
Procurei o sorriso e o brilho de um olhar que o meu enchesse
Porque amar é sentir com dois corações no peito em vez de um só
Sem conseguir distinguir qual dos dois é o que nos pertence

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Cama desfeita

Côa-se a luz por entre as persianas descidas sobre a noite que pouco a pouco se faz dia. É uma luz lavada que se estende alongando-se até nós. Ao meu lado dormes ainda o sono de quem se abandona em porto seguro, chegado a casa após uma longa ausência. A tua pele dourada trás marcas de outras épocas em que vivias perdido longe de mim. Pele morena, sardenta, de quem sempre escolheu viver junto ao mar sem olhar a ventos ou marés. Pele onde eu conheço cada sinal e cada ruga, cada ponto de partida para viagens sem fim com um regresso nem sempre desejado. Sinto-te respirar nesse abandono de quem não se sabe observado, ou se sabendo não se importa porque sabe que está em casa sua.
Lembro-me de outras noites nossas sem dormir, noites em que fugíamos para o mar, sob um céu de estrelas cadentes, e eram tantas que choviam sobre nós que muitas se escapavam ao contar dos nossos desejos. Do mar tínhamos o som das ondas e o reflexo que dele nos chegava no luar. Pedaços de luz transformados em brilhos mil que molhavam os nossos olhos. E era tanto esse mar que se fazia infinito azul aos nossos pés. Éramos então felizes na esperança do amanhã, ainda que esse amanhã não nos pertencesse. Não importava ainda assim, porque cada um daqueles instantes era o mundo. E esse mundo era só nosso.
Assim como agora é só nosso este amanhecer sobre a nossa ausência. Perdemo-nos um do outro em portos inconstantes. Corremos mundos diferentes em ânsias perdidas de descobertas vãs. Para mais tarde ambos voltarmos à praia que foi nossa, lugar onde ambos ancorámos os nossos desejos por cumprir. Mesmo sabendo que era tarde demais para os encontrar. Outros antes de nós os viveram e chamaram seu ao que só a nós dois pertencia. De nosso não sobrou nada. Ambos regressámos de mãos vazias de tantas viagens, para vermos os nossos tesouros saqueados.
Resta-nos apenas a manhã que agora se faz dia. Olho para o meu lado e não te vejo. Toco as rugas no lençol, a marca na tua almofada, sinto o teu cheiro que invadiu a minha pele, mas não te vejo mais. E nesta noite que agora se acaba, não sei se te vivi se te sonhei.

sábado, 29 de agosto de 2009

Marionetas de vida

Linhas cruzadas, vidas trocadas, sons indistintos que chegam de longe sem sentido. Luz baça e sem esperança num túnel sem fim que converge num ponto que se faz longe a cada passo mais.
No infinito está essa fuga que se quer real mas que teima em escapar-se num ápice, com um avanço imenso sobre a partida que se afigura sempre falsa. O espaço alarga-se, aumenta a olhos vistos, mas só o vazio chega, nada mais, preso num avesso de vida. Dor líquida que gota a gota se mistura e se perde num silêncio sem nexo. Acabam-se os sons, também eles rendidos ao silêncio que sobranceiro se impõe num vazio ainda maior.
O universo dilui-se e mistura-se sem forma aparente, rouba os sonhos, a esperança e a luz na sua ausência. Céu sobre o mar ou mar que cobre o céu e das nuvens faz algas, rochas, abismos, lugar de ondas perdidas que se esgotam e se gastam sem encontrar abrigo. Tudo cai, rola e se parte em mil pedaços e reflexos do que fora em tempos.
Onde está esse fim que leva ao princípio? E o princípio, que nunca se acaba, perde-se em meandros ocos que lhe roubam o sentido e a forma e o impedem de chegar ao milagre que se espera. O caminho estende-se em frente, aos círculos, em fases repetidas e conhecidas e que mesmo assim não se evitam.
Marionetas de vida que sozinhas sempre se perdem em busca do caminho certo. Por falta de ser não vêem que os caminhos são iguais aos de outras vidas e que as vidas se trocam, se ganham e se perdem, mas que nenhuma é na verdade de ninguém.
Mas do meio do nada rasga-se o vento em sopro de vida. Sobre a escuridão do instante perdido brilha um fio de luz que se agarra à vida que se quer livre e feliz. Trovão e relâmpago que destrói mas ilumina por segundos e que do caos faz instante parado no passado. E assim da vontade faz-se vida. Cortam-se os fios um a um. As marionetas ganham vida e procuram outras vidas. Para cortarem outros fios e com mais amor fazer mais vida.

Se me quiseres


Se me quiseres procura-me junto ao mar
Numa duna abandonada às mãos do vento
Num caranguejo preguiçoso sobre as rochas
Ou num raio de sol que se fez onda

Vê-me na gaivota sobre o mar
Perdida para além do horizonte
Num pôr do sol laranja feito esperança
De um regresso certo ao outro dia

E chama por mim para que eu venha
Onda feita espuma ao teu encontro
Beijar os teus passos sobre a areia

sábado, 22 de agosto de 2009

Live and let die

Por vezes a vida sente-se por instantes intermitentes, liga desliga, sem rumo e sem lugar, quando as referências que um tempo tudo foram, de repente deixam de ser. Fica para trás o que em tempos foi âncora, lugar do sonho onde a esperança viveu aninhada à espera de ser, por escolha imposta, quando a vontade já nada mais pode fazer.
Live and let die, há que sobreviver mesmo que tudo o mais morra, liga/desliga, on/off, aos soluços por entre instantes de vida misturados com espaços negros vazios que sugam os sentidos e a consciência, para mais tarde reagir, acordar e continuar a viver. Escolhas, lugares, tempo, uma vida que de tão perto senti minha, de repente deixa de ser. De tal forma que a recusa me invade, e prefiro divagar sem rumo, por outras vidas que ainda estão para descobrir por entre a minha.
Por me encontrar no deserto acreditei na miragem que tu eras. Escolhi acreditar no teu olhar, sem querer saber o que a tua boca me negava. Escolhi acreditar que um dia não haveria mais dúvidas, nem diferenças entre razão e sentimento, que o meu amor te tocaria e te mostraria que afinal o meu sentir não mais era do que um eco do teu. Pura miragem que nem sonho foi.
E da miragem fez-se nuvem que partiu. E olho para ti e nada vejo. Queria ainda agarrar um pouco daquela imagem que de tão cheia preenchia quase a ilusão do meu afecto. Mas nada sinto à minha volta no deserto. O vento apagou os teus passos e eu não quis sequer guardar em mim a recordação do sentido que levaste quando te foste. Foi a tua essência que partiu e se afastou de mim. Ou eu que cansada parti, talvez. Sinto que não mais existes. Mas ainda assim, olho à minha volta como se te procurasse. Porque sinto a tua falta na miragem do meu oásis que sem ti perdeu a sua nascente de vida. E eu penso e não sei. Se o que me faz falta és tu mesmo ou apenas a miragem que em ti via e na qual eras rio que corria solto por entre as mil folhas verdejantes que para ti só criei no meu deserto e onde, sem saberes, aplacavas a minha sede.
Dói-me ainda não te ter, mas mais ainda dói-me não mais te querer. O vazio que deixaste atrás de ti parece-me agora absurdo na sua imensidão sem medida. Querer-te bem fez-me sentir-me bem, até que a mágoa chegou e num instante abafou o coração e calou a razão, se alguma havia.
E assim me vejo agora, abandonada de mim, com labirintos abertos sem camuflagem que eu quero rapidamente fechar, mas que sei ter de percorrer lentamente um a um. Como se de uma limpeza higiénica se tratasse, um corte cirúrgico de sentimentos, pois nada pode ficar para trás esquecido para mais tarde ser inadvertidamente encontrado. Os encontros com o passado doem e impedem o futuro que se quer fazer hoje.
Mas uma vez os labirintos fechados e esquecidos sob as dunas, poderei olhar para o céu sobre o deserto. As estrelas lá são mais brilhantes. Uma me guiará até a um novo oásis por descobrir.
E que esse novo oásis não seja mais uma miragem desta vez!

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Caminhos

Entro no carro e sigo sem destino. Estradas que ainda não percorri chamam por mim. Outros as conhecem de todos os dias talvez. Eu não. Hoje quero uma estrada nova que se rasgue e se mostre e me deixe acreditar em caminhos ainda por descobrir. Do nada um caminho novo que surja e se faça escolha. Hoje procuro, mas não quero encontrar. Ainda não. Hoje não. Quero apenas sentir a procura e esperar pelo encontro de uma estrada nova por descobrir.
Outros caminhos me trouxeram aqui. Tantos caminhos, tantas escolhas, virar à direita ou à esquerda, seguir em frente, mas nunca parar. Onde estão os caminhos que me deixaram aqui? Que escolhas certas e erradas me levaram ao início desta estrada que eu não quero ainda conhecer mas já vejo diante de mim? Se ali atrás tivesse seguido em frente em vez de virar à direita onde estaria eu agora? O que haveria lá para mim e em que pessoa me teria eu tornado? Como saber onde e quando escolhi o que sou, o que quero e não quero, o que procuro por fim? Que caminhos fiz afinal? Quais os certos e em quais deles me perdi?
Lembro-me de tantos, tantos me pareceram iguais e me confundiram com as suas diferenças. Tantos me pareceram amenos, caminhos já trilhados e experimentados por outros, com certificado de qualidade, caminhos seguros e sem surpresas e que afinal se mostraram vazios e sem sentido. E me obrigaram a regressar já cansada da viagem, exausta em caminhos tornados labirintos sem sentido onde me perdi. Nessas alturas em que por falta de coragem de me aventurar por caminhos a desbravar, me deixei guiar por caminhos certos e bem sinalizados, mas tão sombrios e sem qualquer forma de vida. E em tantos outros, aqueles que descobri em esboço ainda antes de serem caminhos, aqueles que eu abri em mim à força de arranhões e tropeções, arriscando chegar a um desfiladeiro sem saída ou a um abismo sem fundo, eu me senti tão feliz, apesar das dores das feridas e dos arranhões profundos, apenas pela descoberta e pela coragem de ter seguido em frente, na minha escolha, no meu caminho a descobrir, por mim feito meu.
E assim cheguei aqui. No prazer da estrada não me importa agora o destino. Esse seja o que quiser, não é a chegada que me move e me faz desejar partir. Desde que a estrada seja minha e escolhida por mim eu posso fazer caminho. Mas hoje não. Hoje ainda não. Espero um sinal que me há-de chegar. Quando o coração bater mais forte. Na busca dessa estrada, só ele saberá sempre qual o melhor caminho.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Como eu gostava de ser gato por um dia

Como eu gostava de ser gato por um dia
Ou uma vida, das sete que os gatos têm
Sair em busca do sol, escolher uma pedra, numa escada um degrau de subir ou de descer
Com algumas ervas perfumadas pelos cantos
Numa escada com muitos degraus do céu à terra junto à relva
Escolher o mais liso e o mais quente
Com muito sol
Liso e amarelo de calor
Andar de cá para lá e de lá para cá, cheirá-lo e percorrê-lo todo por inteiro
Devagar, languidamente, sem pressa de chegar ou de escolher
E só então instalar-me lentamente
E ainda espreguiçar-me, esticar uma pata, garra a garra com cuidado

Sentir todo o meu corpo devagar, como se o tempo me esperasse
E todo o tempo do mundo fosse meu
Sentir a brisa no meu corpo, também ela apenas minha
Fechar os olhos, sentir o sol
Dormitar atenta, sem pressa de acordar
Sentindo o mundo inteiro no espaço daquele degrau
Com muito sol
Liso e amarelo de calor
Pudera eu ser uma bola de pêlo felina, abandonada ao sol no conforto de um degrau
Feliz no prazer de nada fazer e só sentir
E de garras recolhidas na vida

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Parabéns Diogo!

Desejo que cresças com o teu coração pleno de doçura, amor e generosidade. Que não deixes nada nem ninguém destruir a esperança que nele vive. Que tenhas a força necessária para perseguires os teus sonhos e a coragem de desistir sem mágoas do impossível. Que saibas acrescentar à tua realidade um pouco de ilusão para dares mais cor à tua vida, mas na medida certa, para não transformares a realidade numa ilusão. Que saibas dar, partilhar e espalhar um pouco de ti à tua volta, sem impor vontades mas criando desejos. Que saibas esperar o melhor, preparando sempre o teu coração para enfrentar o pior. Que nunca percas a confiança, nos outros, no mundo e principalmente em ti próprio. Que nunca deixes de desejar. Que nunca deixes de acreditar. Que sejas acima de tudo feliz e saibas espalhar essa felicidade à tua volta. Parabéns pelos teus nove anos, Diogo!

sábado, 8 de agosto de 2009

E o fim chegou

E o fim chegou. Agora espero sentir a dor que há-de chegar também. Espanta-me contudo nada sentir. Flutuar sobre um vazio sem nome, imenso e absoluto que de repente ocupou todo o lugar que o meu sentir por ti reclamava. Do tudo fez-se nada, sem nome, sem tempo, sem história ou futuro. Sobrou o nada onde há pouco vivia a imensidão do infinito. E a dor não chega, só o silêncio, quase uma paz que me vem de não mais esperar nem querer. De não mais te querer. De não mais seres parte de mim e me teres deixado só em nome de uma amizade sem amor.
Foste palavra por dizer, livro por ler, dom por partilhar, mar sem maré nem maresia. O beijo que não me queimou, as mãos que não me tocaram, o amor sem amar, o fim sem início. Foste tão pouco afinal e eu que sempre quis tudo e nunca o tudo me chegou, fiquei suspensa e parada por ti e exigi tão pouco de mim.
Sem acreditar em fadas nem princesas, armei-te cavaleiro. Vi em ti bravuras irreais, o encanto de um príncipe encantado que seria o meu príncipe de encantar. Não vi que jamais enfrentarias tormentas e dragões para me resgatar da minha torre encantada. Esperei por ti mesmo assim, mesmo sabendo que contos de fadas são coisas de crianças. Erro meu. Esperei em vão. Desisti. Espero agora a dor que me há-de chegar. A dor do fim do meu amor por ti.

domingo, 2 de agosto de 2009

Assim é a amizade


Já vivi sem amor, sem amar e sem ser amada. Já vivi a esperar por dias melhores até descobrir que tinha de lutar por eles. Já vivi sozinha, com uma gata, com marido. Já vivi com saudades do passado a desperdiçar o presente. Já vivi a esquecer o presente e a desejar o futuro.
Mas se olhar para cada um dos meus dias vividos, vejo sempre amigos comigo. Nos bons momentos na alegria da partilha e nos maus momentos no alívio da dor.
Os amigos da minha vida inteira são escolha minha. Cabe-me a mim merecer a cada dia ser também escolhida por eles. Se bem que a minha vida de hoje resulte das escolhas solitárias que fiz, sem os meus amigos eu estaria longe de mim, perdida no início de um caminho que sozinha não conseguiria sequer vislumbrar.
Houve amigos que chegaram e ficaram, atrevo-me a dizer para sempre. Houve amigos que a certa altura partiram e deixaram lembranças e saudade. Outros chegaram há pouco mas parecem fazer parte de mim desde sempre.
Amigos são coisas de alma, a amizade não se mede de outro modo que não seja o sentir em conjunto e o partilhar desse sentir. Assim é a amizade.

sábado, 1 de agosto de 2009

Idades


Ontem passou mais um ano sobre o dia em que nasci. Esse contar do tempo de uma vida assim em anos sempre me estranhou. Não convivo bem com esse espartilhar de uma vida em tempo que eu só sei medir em momentos, que valem pelo que marcam e não pelo tempo que duram. Nasce-se e morre-se num segundo e entre esses dois segundos vive-se uma vida. O que fazer dessa vida entre um segundo e o outro senão vivê-la? O que importa em quanto tempo se viveu, senão o que se viveu? O que importa se vivemos mais um ou menos dez anos, se nada fizermos com esse tempo que nos é dado para viver?
Não gosto de classificar as pessoas. Nem em anos, nem em raças nem em credos. Prefiro classificá-las pelo modo como estão na minha vida e como eu estou na vida delas. É infinitamente mais simples ver com o coração do que com os olhos, basta sentir, mesmo de olhos fechados sabemos.
As pessoas não são lineares nem óbvias, por isso são fascinantes. A capacidade de cada um de nós de se transformar, de se superar, de lutar, de sonhar e de desejar marca-nos de modo diferente em ocasiões diferentes. Houve momentos em que me senti mais jovem mas menos madura, confiante e segura de mim, assim como houve outros em que me senti infinitamente mais velha, mais desanimada e conformada e isso mais não são do que estados de espírito que eu não consigo traduzir medidos em anos de vida nem localizar em idades, mas sim em sentimentos de esperança, vontade e felicidade. Há momentos em que me sinto uma criança em início de vida e noutros sinto em mim o peso da idade do mundo. E não serei a única a sentir-me assim certamente.
Tudo parte de uma atitude, neste caso a idade de cada pessoa é a idade da sua atitude perante a vida. É essa atitude que marca os momentos de uma vida, que afasta rugas e deixa o eterno brilho da juventude em cada um de nós. Quando olho para uma pessoa o que eu procuro ver nela é a felicidade e não a condenação do tempo que sem se saber bem porquê julga que uma pessoa saudável e autónoma pode ser demasiado nova ou demasiado velha seja para o que for. Muito menos para ser feliz.

sábado, 18 de julho de 2009

A última vez


Um dia sem tu saberes vou despedir-me de ti. Vamos encontrar-nos como sempre, no lugar de sempre, à hora de sempre e falar das nossas pequenas coisas de sempre. Não será a última vez que o faremos, mas será a nossa última vez. Só eu saberei que aquele momento será a última oportunidade de sermos nós e não tu e eu simplesmente.
Nesse dia não vais perceber que desisti. Que não mais estaremos lá como sempre eu e o meu amor por ti, porque esse já terá deixado de ser. Sei que desistir não é derrota, é reconhecer apenas que a vontade de alguém prevaleceu sobre a nossa. E ambos sabemos que nem sempre quem ganha é vencedor, assim como nem sempre o vencido perde. E neste caso, como em tantos outros, só o tempo dirá qual de nós ganhou ou perdeu.
Mais tarde ao lembrares-te de mim irás perceber que o brilho da esperança terá já abandonado o meu olhar, irás notar que o meu carinho terá perdido sabor, que o coração terá fenecido.
E então sentirás saudades minhas. Saudades de sentires em ti o que eu sentia por ti. Saudades de te sentires especial nos momentos em que te olhava. Saudades de saber que podias, que se tu quisesses eu seria tua. E nesse dia perceberás que eu desisti. E que de nós ficará só a saudade. Nesse dia vais sentir-te só. E contra isso não vais poder fazer nada.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Aos meus amores


Todos os meus amores foram felizes. Por mais lágrimas de tristeza porventura havidas no caminho, todos eles em alguma altura me fizeram sorrir e me fizeram feliz. Em algum momento, tive esperança, acreditei, vivi, senti e fui feliz. Não me interessa lembrar por quanto tempo foi, interessa-me apenas saber que foi. Porque amar é sinónimo de ser feliz, não se mede em lágrimas ou em sorrisos, mede-se em vida… ou quando muito em suspiros!
Todos os meus amores foram únicos. Todos foram diferentes, semelhantes apenas na forma de sentir, sempre verdadeira, imensa e avassaladora. E foram todos tão diferentes nos seus matizes da minha humana capacidade de amar, dar e partilhar momentos da vida, que todos eles sempre me surpreenderam na descoberta de novos tons na pessoa que sou.
Nem todos os meus amores foram correspondidos. Quantas vezes estive sozinha num sentimento, a viver da esperança da chegada daquela companhia especial que tardava, pronta para partir na única viagem que não posso fazer sozinha. Quantas vezes esperei em vão… e quantas vezes fui obrigada a desistir de esperar para sobreviver. Mas mesmo então fui feliz. Por sentir, por ser, por estar viva e perceber que o meu coração sabia e podia bater mais forte. Por amor.
O meu amor de hoje poderia ser o último. Poderia ser tudo. Poderia ser o mais feliz. O mais desejado, o mais esperado. Mas é um amor com fim anunciado porque vive só em mim. Com mais uma lágrima e menos um sorriso talvez.
O meu amor de amanhã chegará um dia. Será esse o grande amor, o que me vai fazer esquecer todos os outros, o que nunca me deixará sozinha e estará pronto para me acompanhar em todas as viagens da vida. Ou será apenas mais um amor na minha vida, não sei. Mas um amor nunca é apenas um amor. É semente de vida, saudade e partilha. É alimento da felicidade. É tudo. E que seja o grande amor ou apenas mais um amor, não faz mal. Porque eu acredito no amor. Acredito para continuar a viver e ser feliz.

terça-feira, 14 de julho de 2009

... é a vida!

Mariana, a meio de um jogo de computador “…tenho medo de tocar na minha cauda e perder… mas se não tentar não sei se consigo!... é a vida!!!”

E é mesmo! Quantos sonhos deixei por tentar com medo de não conseguir! Quantos sonhos sonhados que poderiam hoje ser sonhos reais! Por falta de incentivo ou por falta de alento, mas sobretudo por falta de coragem de arriscar…
E quando o peso do que não fiz por não querer arriscar se tornou maior do que o peso do que consegui sem arriscar… aprendi!
Aprendi que mais importante ainda do que realmente conseguir… é a tentativa de lá chegar, é o sabor do desafio de tentar, é o orgulho de saber que lutei porque quis, apenas porque quis.
O resultado dessa luta? Se ganhei ou perdi? É absolutamente secundário. Eu diria mesmo que nunca, mas nunca perdi. Ou ganhei o que tentei conseguir ou ganhei o gosto imenso de saber que eu tentei. Que tive a coragem de tentar. E essa tentativa pode levar a uma opção de vida, à escolha de uma profissão, ao afirmar de uma opinião, ao nascer de uma amizade, à conquista de um amor… as tentativas de uma vida são infinitas, mas são todas especiais porque são nossas. Apenas nossas. À medida exacta dos nossos sonhos, dos mais pequenos até aos infinitos.
E se quisermos, cada uma dessas tentativas dá-nos a oportunidade de viver, de crescer e de ir mais longe. No conhecimento de nós próprios e dos nossos limites, mas também no respeito pelo nosso valor, no fortalecimento do nosso amor-próprio. E logo a seguir torna-se mais fácil amar o mundo, os outros e a vida.
Aliás, é isto que é viver. Só assim me sinto feliz. Viver de outro modo poderia talvez ser mais cómodo, mas não teria sabor de vida. Seria um mero esboço de ser e decididamente não valeria a pena o esforço de acordar todos os dias!

sábado, 11 de julho de 2009

Por vezes cansa...


Irritam-me as pessoas desmazeladas! Que não se preocupam com ninguém, nem mesmo com elas próprias! Que preferem ter trabalho a dobrar amanhã para evitarem um simples gesto no momento em que ele é preciso! É algo que ultrapassa o egoísmo, roça a preguiça compulsiva ... e por vezes é mesmo irresponsabilidade. Ou estupidez pura!
Estas pessoas deveriam estar isoladas, em quarentena, para sofrerem sozinhas as consequências dos seus (não) actos. E não caber a ninguém a responsabilidade de corrigir essas consequências, geralmente desastrosas. Porque se ninguém se opuser, estas bolas de neve resultantes de uma negligência agora, outra logo a seguir, podem provocar avalanches catastróficas, não só para quem as começa mas também para quem tem o azar de se encontrar por perto. E sem culpa nenhuma.
E eu pergunto-me: numa altura em que há comprimidos para quase tudo, para dormir, para não dormir, para acalmar, para excitar, para fortalecer, para emagrecer, porque não se consegue inventar um comprimido milagroso para responsabilizar tantas mentes irresponsáveis que teimam em não pensar, em não querer saber e muito menos em fazer seja o que for?
Seria bom! É que por vezes cansa encontrar pessoas assim...

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Há dias assim

Há dias assim. Em que me fazes falta. Em que sinto saudade de tudo, de ti também. Dias em que acordo com vontade de te falar, em que imagino o que fazes, se te irás lembrar de mim por entre os momentos do teu dia. E fico parada. Fecho os olhos para te ver. Imagino tocar no teu rosto, sentar-me ao teu colo, pendurar-me no teu pescoço e fazer-te sorrir. Aflorar os teus lábios, passar os dedos pelos teus cabelos, respirar o teu perfume, inebriar-me de ti. E a minha vontade de ti é tanta que quase te sinto, quase te ouço dizer o meu nome. Quase...
Mas a verdade é que só o mesmo sol nos une nesses instantes, luz e sombra de uma mesma vida. E quando por fim nos encontarmos, os teus olhos vão dizer-me coisas que a tua boca vai negar. E eu vou fazer de conta que acredito. Nos teus olhos ou na tua boca. E logo a seguir vou deixar a vontade correr solta na cumplicidade de um olhar. Em silêncio vou deixar os meus dedos deslizarem e tocarem os teus para os sentir estremecer nos meus. Vou sentir o teu receio abandonar-te e prender-te ainda mais a mim. Vou fazer-te acreditar em ti e trazer-te até mim. Desta vez para ficares.
Mas agora que não estás, escrevo para ti. E peço ao vento que te leve beijos meus...

terça-feira, 7 de julho de 2009

Palavras

Amo-te. Gosto de ti. Quanto menos sentido, mais fácil dizê-lo. Quando não compromete, serve um fim apenas, melhor ou pior, seja ele qual for. Quando não se sentem, são palavras leves, de consumo imediato, "fast-food" de sentimentos, pleno de calorias mas de pouco alimento. E o sentimento, assim diluído, perde sabor.
Mas quando deveras sentido, custa dizê-lo. As palavras pesam receios, procura-se o tom, a altura certa, que por vezes tarda e angustia. Expõe um sentir, um gosto, um carinho, implica um julgamento em que se é aceite ou recusado. Toma a coragem, a decisão de arriscar, a vontade de dar e só então as palavras nascem. E deste modo, depois de sentidas, são ditas, oferecidas a alguém. Podem mudar apenas um momento, ou uma vida inteira. Podem provocar um sorriso ou uma lágrima. Pouco importa. Serão sempre oferta de felicidade.

domingo, 5 de julho de 2009

Uma questão de lógica...











A Mariana tem medo de cães. É um facto que não aceita argumentos. Do alto do meu pensar racional de adulta, pensei que esse medo fosse proporcional ao tamanho dos cães. Que os mais pequeninos lhe parecessem inofensivos...
Hoje cruzámo-nos com um cão mínimo, que passeava na ponta de uma trela maior do que ele. Pensei vitoriosa: deste ela não tem medo! e confiante perguntei-lhe: "Então Mariana, deste cão não tens medo, pois não?"
Resposta pronta, ainda mais confiante, com a segurança dos seus 7 anos: "Claro que não mãe! Tem trela...!"
Afinal, é tudo mesmo uma questão de lógica.

"A vida de Pi", Yann Martel

A VIDA DE PI de Yann Martel
Tradução: António Pescada
Colecção: Literatura Estrangeira
Ano de Edição: 2003
Editora: Difel
Nº Páginas: 344
ISBN: 972-29-0655-0
EAN: 9789722906555
Prémio Man Booker 2002
Prémio Hugh MacLennan de Ficção 2001
Prémio Journey 2001

Sinopse:
"Depois do naufrágio de um navio de carga, um único bote salva-vidas permanece a flutuar à superfície do agreste Oceano Pacífico. A tripulação do barco consiste numa hiena, um orangotango, uma zebra com a perna partida, um tigre de Bengala e Pi Patel, um rapaz indiano de 16 anos de idade. O palco está preparado para um dos mais extraordinários fragmentos de ficção literária dos últimos tempos. Um romance com tão rara e assombrosa habilidade para contar histórias que, como diz uma das personagens, talvez faço o leitor conseguir acreditar em Deus."

Este é um livro que se lê devagar, não se devora, mas saboreia-se e faz-nos pensar. É uma fabulosa fábula sobre a condição humana, escrita numa linguagem simples e levemente filosófica, que nos surpreende não raras vezes com frases extraordinárias. Talvez seja o seu autor quem melhor o define quando diz que "Pi é o espírito humano no seu melhor".





Detalhes


Pormenores. Detalhes sem importância. Não, não é verdade! São os detalhes que realmente contam. São eles, poderosos, que fazem toda a diferença… que acrescentam sabor ou destroem num instante o esboço de uma emoção.
Os detalhes que me chegam dos outros avivam recordações, inspiram amizades, amores, partilha, promessas, trocam comigo cumplicidades, fazem-me ser parte. Ou então não! Destroem sonhos, mostram-me que “afinal não!”… que estou só num sonho, numa ambição de ser, podem até tirar-me a coragem de continuar.
São detalhes. Pormenores. Mas são eles que dão o sentido ao meu todo. Que mostram o norte no caminho que sigo, que me fazem avaliar o sucesso da minha caminhada. Que me embriagam de coragem ou me tentam a desistir.
A alegria de descobrir um pormenor inesperado numa atitude esperada! Que doutro modo quase passaria despercebida. É única... a cereja no topo do bolo!
Do mesmo modo, os meus detalhes chegam aos outros. Reveladores. Do que sou, do que faço, do que quero e sinto. Que se percam ou não já não depende de mim.
Os grandes feitos por vezes são tão grandes que se tornam fáceis. Porque já estão pré-formatados em tantos hábitos. E perdem significado porque perdem espontaneidade. São os pormenores desses grandes feitos que contam, que marcam a diferença. É aquela subtileza de quem dá que faz a oferta ganhar um sentido especial em quem recebe.
Os detalhes alimentam e os detalhes destroem. Os detalhes fazem nascer ou morrer emoções. São a chave para momentos. Momentos que podem ser tudo. Ou simplesmente não serem.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Bem-querer

Por vezes a tristeza surge em mim. Em silêncio, senhora de si, chega, ordena à alegria que se afaste para lhe dar o lugar que reclama. Que forma toma para se apoderar assim do que lhe não pertence? E como ganhou ela caminho até mim? O que chegou aos meus olhos, o que faltou aos meus ouvidos, que pedaço de mim me falta quando a tristeza assim surge?
Por vezes é tudo, outras vezes um nada. Um olhar que não chegou, uma palavra por dizer, um silêncio que dói, um vazio a mais, uma pena que pesa e arrasta, sem motivo nem destino.
E a tristeza brota, cresce, vive e pensa que vai viver em mim.
Mas eu sou terreno de vida, não de penas, o mal em mim não tem abrigo nem caminho. Não que a vontade comande ou tenha tal poder. É apenas a natureza que é assim. Basta afastar um pouco o olhar de mim e pousá-lo à minha volta com cuidado. Para saber que a vida me quer bem. E contra esse bem-querer, o que pode uma simples tristeza?

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Ericeira

Respira-se o mar no ar da Ericeira. É ar que carrega gotas de mar, salgado, que se acrescenta e materializa em nós, humedece os pulmões e suaviza o ser. É mar a crescer e a irromper por toda a vila, em cada praia, por sobre as rochas, em cada rua sentido. É mar que conquista ao primeiro olhar, nos tira a voz, nos domina. Que nos fala e nos obriga a escutar.
Tem várias caras mas uma só alma este mar.
No verão é irmão, deixa-nos brincar, oferece-nos as ondas, faz-nos crianças, trás memórias de infância, sente-nos eternamente jovens, como se o ontem pudesse ainda voltar amanhã. A cor e a luz inundam-nos de brilho, ferem os olhos, a brisa vive junto ao mar. Por vezes cresce e chega a nortada para nos lembrar que este é mar a sério, sem retoque. Ao longe o Cabo da Roca impõe-se, magnífico, vizinho amigo que nos mostra que aqui pertencemos ao mar mais do que à terra, que num instante esquecemos e deixamos para trás, virados que estamos sempre sobre o mar.
Mas no inverno este mar é dono e senhor do espaço e de cada um de nós. O primeiro olhar que dele me veio quando o meu nele pousou foi medonho, ameaçador, ocupado a defender-se do céu que num jogo de guerra, o envolvia em tempestade e trovões. Fiquei suspensa de cada relâmpago, tremi com cada trovão. Entendi o significado da imensidão, do absoluto, da beleza petrificante que pode haver na sua força. Rendi-me.
Aprendi que logo a seguir, porém, céu e mar fazem a paz. E céu e mar brincam, trocam brilhos, diluem-se num só. Por vezes o horizonte escapa-se, esconde-se, é o céu a querer ser mar, ou o mar a quer imitá-lo. Quando chove fundem-se ainda mais num só corpo, numa só vida, parede de filigranas estonteantes, tão próxima de nós que duvidamos da nossa capacidade de respirar. Outras vezes as nuvens chegam, cobrem o mar, parecem protegê-lo e logo vem o sol, a brincar, a rasgar por entre as nuvens para se precipitar no mar em cordas suaves de muitos brilhos.
Só aqui o céu tem este brilho, só aqui o mar em esta cor, que lhe chega porventura da alegria deste céu ter este mar por companheiro. E no entardecer, quando o mar acalma para se despedir do sol, este em troca transforma-se em mil cores para o acariciar e o prender ao seu regresso.
É neste mar companheiro que lavo os olhos de mágoas quando preciso de alívio para as minhas tristezas. É a ele que eu ouço quando preciso de alento. A ele confio os meus receios, segredos e anseios. Forte ou suave ele tem a minha alma.
Desde o primeiro olhar entendi que esta é terra de céu e mar em que o mar, mais pequeno que o céu porventura, nos transporta até à imensidão do infinito que nos cobre e nos faz pertença deste céu.
Entendi que este mar ama esta terra e é o mar que me fez amá-la também. E é tanto o amor do mar que o faz sair de si, evaporar-se, transportar-se com a cumplicidade deste céu, transformar-se em humidade salgada para assim se poder colar à terra, a acariciar e invadir, nevoeiro de mar, forma de amor.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Mail a uma amiga

O que acontece é que quando nos "apaixonamos" caímos na estupidez de nos esquecermos de nós e de como somos... e tendemos a compensar a falta que nos fazemos a nós próprios com o que queremos/esperamos do outro. Isso nunca resulta, mas, por vezes, esquecemo-nos disso.
Nós temos de nos manter como somos e temos de continuar a sê-lo sempre, senão “descompensamos”, ficamos infelizes porque o outro nunca vai ser exactamente como nós queremos, não vai dizer sempre o que queremos ouvir, não vai fazer sempre o que queremos... e isso vai (estupidamente) fazer-nos infelizes e insatisfeitas...
Se não te "desviares" de ti e tentares apenas pôr o outro ao teu lado (não no teu lugar, nem tu no dele) é só uma questão de veres se ele te acompanha ou não, podes até abrandar o passo para que ele consiga estar lá, ou podes acelerar para tentares acompanhá-lo, mas não deves nunca desviar-te do teu caminho. Se ele não conseguir (ou não quiser) acompanhar-te é porque não é "companheiro" para a tua "viagem".
É isto que eu penso e apesar de cair inúmeras vezes no mesmo erro, só quando me sinto terrivelmente infeliz é que consigo voltar a mim e... com ou sem "companheiro de viagem", acredita que me sinto muito mais feliz quando isso acontece, porque em vez de tentar "tirar" a felicidade apenas de uma pessoa, ganho a capacidade de a retirar de todas as pequeninas coisas que me rodeiam. E isso é a verdadeira felicidade. E apesar do amor supostamente nos fazer felizes, tenho de concordar com o final do livro “Marés de Inverno” quando o Vasco diz que "o amor é a prisão do espírito. para ser livre não podia amar". É isso.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Viver diferente

Por vezes vem a vontade de fazer tábua rasa de todos os meus amores! Esquecer os passados, ignorar os presentes e fazer já hoje passado dos que chegarão no futuro.
Trocar a ordem, o sítio, o esperado das coisas. Mudar de pele, de mar e de lugar. Trocar de eu. Viver diferente. Esperar menos.
Da onda sempre quis o mar. O todo. Cada onda vem, passa e dá lugar a outra. Mas cada uma é única. Forte ou suave, passa, não é nossa. Não fica em nós. Não nos pertence. Dela fica-nos a surpresa, a emoção, a vida que nela sentimos, um rasgo de felicidade, o sabor a sal e o cheiro a maresia. É única... mas não eterna. E assim, por mais pequena que seja, tem sempre o todo nela.
Assim são os amores. Uns, suaves, passam e deixam em nós a lembrança da doçura. Outros sacodem-nos, tomam-nos, levam-nos de nós, exigem. Melhores ou piores, são nossos, lembrados ou esquecidos... mas únicos.
O amor é igual ao mar. E o mar é tudo. E como o mar, anseia e procura a enseada que o acolha, aceite as suas marés, desfrute da sua força, sabendo que as suas ondas irão transformar o seu rosto, com sorrisos ou lágrimas, mas que tudo isso significa vida.
Do amor eu quero apenas o que quero do mar. Que me surpreenda, me envolva, me deixe temer para aprender a confiar, me deixe mergulhar até não mais poder respirar, me deixe brincar e rir... me faça sentir única e especial, uma onda ou uma maré, que passe por mim e me deixe com a pele molhada, com espuma, salgada... de mar e paixão.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

A Formiga Matemática

Mais um texto infantil... não resisto a publicá-lo aqui. Não tenho intenção de fazer deste espaço um blog de “família”, mas lá em casa vivem três seres devoradores de livros, papel, canetas e lápis de cor, não só para escrever e pintar o papel propriamente dito, mas também para assim aprender a colorir a vida. É habitual ler-se, muito... e escrever vem naturalmente por acréscimo. Por imitação pura ou por força dos genes, os meus dois filhos escrevem imenso, naturalmente, desde que aprenderam as primeiras letras. Cada um no seu estilo próprio, tentativa após tentativa, personalidades diferentes que se unem no amor aos livros... e também (felizmente!) no amor ao mar...

Esta história foi escrita há dias pelo meu filho Diogo, 8 anos, quase 9:

A Formiga Matemática

Há muito, muito tempo atrás, quando nas escolas ainda não havia Matemática, nasceu uma bela formiga. Os seus pais deram-lhe o nome de Gonçalo.
Passados uns anos a formiga chegou ao 1º ciclo. A primeira coisa que a professora lhe ensinou foi a escrever. O Gonçalo escrevia bem mas tinha sempre na cabeça um nome que era Matemática. Esse nome não lhe saía da cabeça.
Até que um dia, quando o Gonçalo ainda tinha a palavra na cabeça, disse:
- Ma-te-má-ti-ca.
A professora perguntou:
- Qual é o significado dessa palavra?
- Não sei professora… acho que são números e sinais que brincam juntos – disse a formiga meio a tremer.
A professora estava muito espantada:
- Diz-me, diz-me, como é que se faz.
A formiga Gonçalo, com algum receio, disse:
- Então, primeiro é o um, depois o dois, o três, o quatro, o cinco, o seis, o sete, o oito, o nove, o dez e por aí fora.
A professora ficou impressionada e foi falar com o Presidente. O Presidente declarou a formiga Rei da Matemática.
Passados uns anos, o Gonçalo, ou seja, o Rei da Matemática, disse aos seus amigos:
- Daqui a um mês partirei num avião a jacto para as minas. Lá vive o meu amigo Jocasaint que sabe fazer poções mágicas.
Uma formiga perguntou:
- Mas esse teu amigo também é uma formiga?
- Não. Este meu amigo é um louva-a-deus, mas não se preocupem que não faz mal a ninguém!
- Que poção é essa que lhe vais pedir? – perguntou outra formiga do grupo.
- Vou pedir-lhe uma poção que me vai fazer ter o poder de meter a Matemática nas vossas cabeças e de pôr a Matemática também nas escolas dos humanos.
Durante esse mês o Rei da Matemática foi construindo o seu avião a jacto. Como era muito bom e rápido a fazer contas, conseguiu construí-lo só num mês.
Passado um mês, quando já tinha o avião todo pronto, despediu-se do formigueiro e vrummm! Lá foi ele para as minas que ficavam a 10 léguas do formigueiro.
Quando chegou às minas carregou no botão de transformação e aterrou. O avião transformou-se logo num carro a jacto e quando ligou o turbo foi a uma velocidade tremenda.
Ao chegar a caso do seu amigo, bateu à porta e apareceu logo o louva-a-deus:
- Entra – disse ele. Já estava a ver que não te via mais.
A formiga disse, muito apressada:
- Preciso que me faças uma poção para eu poder meter a Matemática na cabeça do meu formigueiro.
- Está bem, mas podias-me ir buscar ao armazém uma lata de poção mágica? – pediu o louva-a-deus.
- Sim. OK.
Quando a poção já estava pronta puseram-na no porta-bagagens. A formiga Gonçalo disse adeus e partiu.
Quando chegou ao seu formigueiro bebeu a poção mágica do seu amigo e começou a espalhar a Matemática por todo o lado, pelas formigas e por todas as escolas do mundo.
Assim conseguiu realizar o seu grande desejo.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Ontem

O nada das minhas palavras de ontem foi apenas a outra metade de mim...
A metade do nada que agora surge depois do dobro que foi.
Foi tempo passado à espera do início que nunca deixaste ser
Apesar do teu sentir, do tremor das tuas mãos, do teu olhar molhado...
Não entendo esse teu sentir sem viver... como não entendo viver sem sentir...
Fizeste de mim mercúrio líquido espalhado por labirintos sem fim
Cimento escuro e húmido, sem mar, sem ar... sem respirar
Quase me perdi de mim... perdida por ti!
Quis apenas dar-me, sem encontrar medo em ti de me receberes
É por mim que o fiz, não por ti
Apenas porque é o meu modo de ser e de estar
Intensamente em tudo o que sou, porque só assim sou eu.
Porque não te perdes por mim, se sem mim te sinto sempre perdido?
Que vôo falhado é esse que não te deixa alcançar mais longe?
Porque te queres sempre conter... e me queres conter a mim?
Acaso alguém consegue conter o mar?
Apenas a lua, mas repara, dela nós só temos o luar.
Queria para sempre ser uma daquelas pequenas coisas que te fazem feliz ...
Dizer no fim, ainda com ternura, “acabou”…
E sair de mansinho… sem ruído
Do mesmo modo como cheguei…

"Caos Calmo", Sandro Veronesi

Sinopse:
Enquanto Pietro Paladini salvava uma desconhecida de morrer afogada na praia, a sua mulher morria perante os olhos incrédulos de Claudia, a filha de ambos. A partir desse dia, tudo muda. Pietro decide não voltar ao trabalho e começa a passar os dias sentado em frente à escola da filha. Mas a dor e o luto pela mulher parecem não o afectar como seria de esperar. A sua vida continua, ainda que agora num novo e inusitado cenário, que, por sua vez, exerce um fascínio inexplicável sobre os novos e os velhos amigos, o irmão, a cunhada e os colegas de trabalho que ali se deslocam para terem com Pietro conversas para as quais nunca haviam tido coragem. Em vez de lhe darem os pêsames, fazem-lhe confidências, expõem sentimentos e inseguranças numa série de histórias paralelas que levam o protagonista a reflectir sobre a sua própria existência.Esta obra foi adaptada ao cinema, num filme realizado por Antonello Grimaldi, protagonizado por Nanni Moretti e distribuído em Portugal pela Midas Filmes.

O título atraiu-me, não vi o filme...
A “simplicidade” da ideia à volta da qual se escreve este livro é genial. Perante uma situação de choque brutal, o narrador deixa apenas fluir pensamentos, sensações, ligações afectivas tal qual surgem a cada um de nós, sem filtro... e o resultado é surpreendente. A linguagem, clara e acessível, é a dos pensamentos voluntários e involuntários que a todo o instante tomam conta de nós e que aqui são transmitidos ao papel... num “caos calmo”, que nem sempre conseguimos entender, mas que faz terrivelmente sentido.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

As ondas do mar

… um texto escrito pela Mariana, 7 anos, minha filha:

Quando fui à praia vi as algas verdes e os peixes coloridos. Quanto se mexiam parecia-me ver estrelas-do-mar. A maré baixou e já não via mais nada nas profundezas do mar. A maré subiu e vi algas que pareciam flores da terra. Era lindo!
Fui mais para o fundo e vi um golfinho a saltar, que quando ia para a água fazia salpicar tudo. Era tão bonito que nunca saia da água, mesmo se não respirasse.
Passei lá um dia sozinha, distrai-me porque era tão bonito, tudo estava calmo. A maré desceu, mas eu estava tão longe que fiquei ainda dentro de água.
Ai foi tão fantástico que um dia vou para lá sonhar com as ondas!

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Momento

A inevitabilidade de um momento no futuro. Em que eu sei que te vou encontrar, ainda que não te conheça. Em que por instantes nenhum de nós vai respirar, para logo a seguir deixarmos o coração bater com mais força. Olhares feitos de um só brilho. De um momento. Em que vou ficar suspensa no tempo, tendo de escolher entre lançar-me num abismo ou atirar-me para os teus braços. Para que me prendas e me guardes contigo. Vou querer sentir o teu hálito, o cheiro da tua pele, para o comparar com o cheiro do mar. Vou querer sentir os teus dedos no meu corpo, o teu corpo no meu. Vou querer tocar-te, sentir-te, primeiro suavemente, para depois de acariciar com posse, fazer-te meu, arranhar-te para depois te lamber as feridas. E entre nós um desejo crescente, o suor, líquido, a escorregar e a fazer-te deslizar para dentro de mim. Uma e outra vez. Até o coração rebentar para além do peito e para além de nós. Para sempre.

Amigos

Encontrámo-nos todos, ou melhor, quase todos. Os “amigos da Ericeira”, alguns amigos de há anos, outros, amigos que continuam a ser de todos os dias…
Éramos muitos, cada vez mais, porque um amigo trazia quase sempre outro amigo e esse novo amigo, por vezes, ficava connosco.
De segunda a sexta-feira a nossa vida não era nossa. Era um papel que desempenhávamos, à espera de sexta à noite… quando começávamos a chegar… uns após os outros.
E conversávamos, dançávamos, namorávamos… No outro dia havia a praia e o mar à nossa espera. E os jantares… em casa de uns ou de outros, quantas vezes éramos 15 ou 20, cabia sempre mais um. E as festas, quantas festas por tudo e por nada… e sempre o mar e a praia…
Chegou mais tarde a altura em que começámos a casar, a ter filhos, a viver outras vidas. Vidas que tomaram novos rumos. Nem sempre próximos. Alguns foram embora para sempre. Outros permaneceram unidos.
Agora, alguns anos mais tarde, tentámos encontrar-nos todos. Muitos vieram. Uns ainda casados, acrescentaram mais alguém ao nosso grupo, outros já se separaram, e outros ainda estarão em vias de o fazer…
Alguns de nós não se encontravam há anos, outros continuaram a encontrar-se sempre. Mas neste dia em que quase todos “regressámos a casa”, o tempo parou… como se fosse ainda o mesmo daqueles dias em que a Ericeira era “quase” só nossa.
Foi bom rever-vos amigos de tantos anos, amigos de sempre! Voltem sempre! O mar continua o mesmo!...

domingo, 7 de junho de 2009

Ensinar a ser maior...!

Subitamente, por entre o som dos telefones, dos cut-off time, das Target II, dos basis points, spreads e escalas de juros, surgiu um novo tema que veio suavizar os picos do nosso dia-a-dia. Tal como uma vaga de praia-mar alisa a areia revolta, assim uma vaga maior nos veio mobilizar a todos, pendentes de uma revelação, da formalização de um processo que há anos aguarda a sua concretização. Vai ser agora. Finalmente.
A família de uma colega que antes de mais é uma Amiga vai crescer, não por força do amor aliado ao nosso instinto mais primário de sobrevivência da espécie que através do nosso ADN nos impele a ter filhos, mas por força apenas do amor. “Apenas” por força do amor. Sempre, sempre a força maior…
Esse amor que nos sobrepõe a nós próprios na ânsia de dar, de partilhar, de fazer alguém feliz. De contribuir para acomodar outros seres, no seu início de vida, nas nossas vidas. De ensinar a alguém a beleza do mundo, para além da beleza que existe em cada um de nós, seres vivos, que por um acaso partilhamos este planeta e este tempo.
São dois seres, duas meninas, irmãs, de 4 e 5 anos apenas. Em vésperas de serem adoptadas pelo coração imenso de uma família, que espera esta oportunidade há anos e anos. Sem perder a esperança. Sempre à espera. Com um amor imenso, pronto, sempre a crescer, à espera apenas de ser partilhado…
Vidas que agora vão mudar. As de quem as recebe e as delas, certamente ainda muito mais. Vão ter a surpresa de descobrir que alguém as ama, incondicionalmente, não por serem parecidas com o pai, com a mãe ou com o avô… mas sim porque são dois seres lindos, a quem alguém deu o primeiro impulso de vida, mas que não as pode acompanhar na descoberta dessa vida.
E essa é a tarefa que cabe aos pais: estar presente, ensinar a descobrir, acompanhar na descoberta, ajudar nos momentos piores, celebrar os melhores, enxugar lágrimas, sarar feridas, ensinar a escolher a beleza e a felicidade, a ter coragem e não desistir, a seguir sempre em frente... Ensinar a ser maior!
Do modo como esse amor é dado, assim se formam vidas. Que se espalham por outras vidas. Que tocam quem está ao lado e vê crescer esse amor a cada dia que passa.
Obrigada Tina e Quim por me deixarem participar neste projecto de amor!
Parabéns pela vossa força !!!

sábado, 6 de junho de 2009

“Marés de Inverno”, Luís Miguel Raposo

Não poderia deixar de falar (mais uma vez) deste livro. Se quero falar de livros, este terá sempre de ser o primeiro, porque foi com ele, com a história dele, com a minha história com ele que nasceu o impulso que me trouxe até a esta “tentadora maresia”.
O que eu senti ao lê-lo foi escrito num momento e as palavras que escolhi, apesar de escritas por mim, estão guardadas onde pertencem, no blog do livro e do autor. Já deixaram de ser só minhas.
Aqui apenas quero dizer que foi um livro que me roubou um pedaço da alma e mo devolveu maior. É um livro feito de mar, do modo como eu o sinto e vivo. E que, como o mar, me tocou, me seduziu e me levou com ele…
O que disse a alguns amigos a quem o ofereci:
É um livro escrito com uma linguagem muito própria, com frases construídas de palavras improváveis, que nos arranham as emoções por serem “tão demais”… mas cujo resultado final, surpreendentemente é de uma extrema suavidade e doçura…
É um livro escrito de dentro para fora, em que a história que conta é um pretexto apenas para a explosão das emoções e dos sentimentos, porque este é um livro feito de “sentir” e não apenas de “contar”. Como toda a “literatura” deve ser.

Cativar: Criar laços …

“”Cativar” quer dizer o quê?
- É uma coisa de que toda a gente se esqueceu – disse a raposa. – Quer dizer “criar laços”…
- Criar laços?
- Sim, laços – disse a raposa. - Ora vê: por enquanto tu não és para mim senão um rapazinho perfeitamente igual a cem mil outros rapazinhos. E eu não preciso de ti. E tu também não precisas de mim. Por enquanto eu não sou para ti senão uma raposa igual a cem mil outras raposas. Mas, se tu me cativares, passamos a precisar um do outro. Passas a ser único no mundo para mim. E eu também passo a ser única no mundo para ti…”
in “O Principezinho”, Antoine de Saint-Exupéry


Os livros criam laços. Entre quem os lê, entre quem os partilha... Entre as pessoas e a felicidade. Entre a vida e o sonho, entre a coragem e a obra…
Podem ser imensos, podem invadir-nos, perturbar-nos, levar-nos para além do infinito, sabendo que para além da imensidão ainda nos espera o absoluto.
Os livros ensinam o que já temos na alma, mas que por algum acaso esquecemos.
São palavras ditas, criadas, rasgadas, atiradas, misturadas ao sabor de um momento, mas que quando encontram caminho em nós, têm o poder maior de recriar o nosso mundo.
Partilhar um livro é dividir um tesouro, é sempre encontrar um amigo. É ser feliz.

... Continuação


Deixo aqui um pensamento, que não é meu, mas de alguém que faz parte do meu grupo de Amigos que são o farol com que posso sempre contar nos meus dias de tempestade.
Surgiu da sua memória, por coincidência, no seguimento do meu pensamento anterior:

“Antes era o mar, agora o céu
Que traz calma ao medo e esperança ao desespero.
Não importa a cor, a luz, o brilho, a quantidade de estrelas ou nuvens
com que se enfeite,
Nem tão pouco que se esconda em neblinas negras
A permanência constante dessa existência azul, apazigua, conforta!
Todos os desencontros e distâncias se resolvem um pouco nesse invólucro comum
de extensão tão imensa e infinita para o olhar.
É que o céu não está apenas acima, mas em todo o redor. Envolve! Na falta de um abraço, esse envoltório sempre é um abrigo ao desamparo de tantos dias.”

IC

terça-feira, 2 de junho de 2009

No início era o mar

No início era o mar... uma imensidão azul, brilhante de uma intensa maresia que nos chegava .. e nos penetrava cada poro, nos invadia com o ar que respirávamos, nos sugava a alma... e no-la devolvia maior!
Naqueles dias eu ainda não sabia o que o mar acrescenta em nós.
Sentia apenas a frescura da areia molhada que me arrepiava os pés, sentia a sua firmeza suave sob a pele, e sentia a vontade de continuar em frente, sempre em frente, sem medos nem temores.
Sentia a espuma a chegar... mais uma onda ... o suave balançar, a mão do meu pai que me arrancava a uma onda maior e me ensinava a confiar. No mar, como na vida.
Mas por vezes o mar tomava conta de mim, ultrapassava-me, fazia-me pequena, mais do que eu era. E eu aprendi o desafio e a coragem para o vencer.
Mais tarde, junto ao mar chegaram os amigos... as brincadeiras, as emoções. O alargar de horizontes, o apoiar, o ouvir e o partilhar. Aprendi a amizade.
E de repente... chegou a emoção maior, o arrepio da alma que nos leva para além de nós e para além do mar. Aprendi o amor.
Chegou também a dor, a dor de perder, a dor de não ser. Temi...
Mas, naqueles dias, esquecida de mim, via o sol, o azul do céu, o azul do mar, o azul sem fim...
E aprendi o que me chegou do mar e que sempre havia de perdurar em mim: a felicidade.